quinta-feira, 8 de março de 2012

Walk on the wild side



“Há em tudo um limite que é perigoso transpor, porque, uma vez transposto,

já não há processo de voltar-se atrás.” Dostoiéviski


a chuva fere a pele recém depilada
a luz do poste é bem vinda na escuridão
o rapaz de vestido vermelho e boca coral
enxuga o sorriso que as lágrimas da noite desfez

a moça do interior ajeita o aplique
retoca os lábios rachados pelo sol da lavoura
as mãos percorrem o próprio corpo à visão do passante
e o estômago ruge como rugia o arado nos campos

o mendigo se aquece na loucura
os letreiros não mais iluminam Madame Satã
a morte não vem do fio da navalha
está no abismo dos prazeres imediatos

morta a juventude, os sonhos, a lucidez
sob a maldição de Dostoiéviski
os limites transpostos se fecham à possibilidade de volta
e a tragédia humana afoga as almas na madrugada.

Márcia Leite
Imagem: Madame Satã, http://nandofilosofo.flogbrasil.terra.com.br/foto16674457.html

Walk on the wild side é o título de uma canção de Lou Reed, inspiração para este poema.


4 comentários:

Mozart Carvalho disse...

Salve poeta! Tu não vieste ao mundo para ser pedra. Apesar de empedernir as palavras na prisão perpétua da condição humana. Tu separas, delicadamente, como artesã perfeita, o teu lugar de origem. “os limites transpostos se fecham à possibilidade de volta e a tragédia humana afoga as almas na madrugada” Mozart

Sérgio Gerônimo disse...

Salve Marcianita, vc como sempre me causando espanto. O feminino é plural e vc sabe das coisas. me senti encostado aos postes sem semblante, sem lembranças ancestrais e sem lentes. procuro-me... 10 moça, bjs sg

Sérgio Gerônimo disse...

este será o 3º - espanto puro, me vi encostado aos postes sem lembranças e sem limites ancestrais, vc sabe ser o feminino, bjs sg

Barbara disse...

Sem fôlego, entrego-me às palavras nuas...
A dose certa. Enlouqueço.