quarta-feira, 20 de junho de 2018

STALKER

                             
                                                               (nem os gritos dos manicômios são tão sombrios quanto  o rastro dos  teus passos)                                                                                                                             

lágrimas bandidas
roteiros mentirosos

intenções óbvias
mente ardilosa

pensamentos obsessivos
mentiras criminosas
                          
                                         (inferno como critério)

para bem predar é preciso
viver o tempo de conhecer
(nos desta espécie essa incapacidade é histórica)
as que lhe escapam são as que aprenderam ser
carvalho -  que não se dobra
água - que ninguém seca
lua - que se renova.

Márcia Leite


sábado, 25 de agosto de 2012

E por falar em arcanjos...

 
Dezembro de 2000

Querem clonar Deus, li nos jornais outro dia. Meu anjo da guarda me contou que Maria sorriu, indulgente,
quando Gabriel lhe contou a novidade. José, na sua sabedoria, fez ouvidos moucos e foi cuidar de um degrau da Escada que rangia. Miguel chegou a pensar em descer e cortar algumas cabeças, mas Rafael pediu clemência. Os Reis Magos esconderam seus agrados. A estrela de Belém benzeu-se e correu céus gritando: heresia, heresia! O Sol, esquentado, provocou uma rápida eclipse (mas quase ninguém notou pois a tarde era chuvosa). O Menino Jesus rolou de rir de seu rebanho traquinas e escreveu num cometa que passava: Crianças, o Amor É - não se fabrica
ou copia.
Márcia Leite, para Rio Total, Ano 2000DC
Esta página é parte integrante da Revista Rio Total
Editoração e Coordenação
IRENE SERRA
irene@riototal.com.br

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Bambuzal

a José Leite

o bambuzal dança no sul
porque a divindade está no sopro

indicando o caminho 

fecho a porta e rumo ao norte
em busca de mim

vou trançar os dedos
nas raízes de meu pai 


fincar o estandarte vermelho
na fenda das minhas dores 


comer a flor de cactus
desaguar minhas vergonhas de sulista


cavar a terra com as mãos de José
para ver brotar o açude mágico

que matará minha sede de justiça

correr entre os pés de mandioca braba
pintar meu rosto com o pó da terra

olhar o mundo com os olhos d’água de Joana
para melhor entender os homens

deitar na caatinga
banhar meu ventre no luar do sertão
reparir meus filhos
e crescer.


Márcia Leite, em Versos Descarados, Ed. OFICINA, RJ 2009

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

dois minutos




tempo suficiente para
a leitura de um soneto
quinze versos livres
entrar e sair de um ataque de nervos
arquitetar uma pequena maldade
mudar de ideia
decidir aceitar o vinho ao lado
tocar algumas pautas de um noturno
acompanhar a lua surgindo detrás da montanha
escolher o desejo certo intuindo  passagem de cometa. 
Márcia Leite, em Lua atravessada 
Imagem: http://pt.cantorion.org/music