quinta-feira, 28 de maio de 2009




nível intermediário

Adélia quer um amor feiinho...
ela, que trilhou o caminho do céu com Jonathan
e me desfez em pedacinhos
quando falou do seu homem limpando peixe na cozinha
eu aspiro Adélia
mas quero um amor bacana pra brincar junto
altinhos, no Carmelitas
dançar sacana e molhado no Carioca da Gema
me emputecer percebendo seus olhares de esguelha
(esquecer tudo depois)
ir no final de semana pro Capitão na Areia

ombro roçando ombro na Praia do Forno
só o pensamento acelerando a respiração
depois da fase ‘Amor? De qualquer jeito, qualquer um’
hoje eu quero é um amor bacana
pra que eu não precise explicar o que escrevi
que me corrija as crases, os hífens, os parênteses
que converse comigo sobre a criação do mundo
se emocione olhando o Universo do Hubble
e seja paciente com minha mania de PS

um amor feiinho, do jeito que também sinto o desejo
tem mesmo seus dulcíssimos pacíficos encantos
adora feijão preto com alho, café forte na caneca
é cazuzianamente exagerado, te acha sempre linda (e diz!)
nada exige, não queima teus neurônios
te dedica todas as músicas de amor do Roberto
ri, deliciado, das tuas manias
faz xixi de madrugada sem te acordar
te deixa enfeitar a casa inteirinha de chita
é todo fidelidade, carinho, consideração

é...Adélia sabe tudo...
uma pena eu ainda estar na fase do amor bacana.
Márcia Leite

aqui jaz Márcia Leite
a que viveu inutilidades
conversava com abelhas
e conhecia (pelo nome!)
todas as andorinhas
de final de tarde.



Márcia Leite

Tarot

A busca da poesia me desfaz
em múltiplas facetas sobre a mesa
nada me compõe quando persigo
a palavra que dirá o pensamento
me desfaço em lâminas
minuciosamente observadas
através de microscópio cósmico
o único permanente em mim
é o místico.


Márcia Leite



deixai-me lacunas para preencher
quando esses dias se forem
deitando na noite o que não vivi
criando finais ao meu jeito



deixai-me lacunas para preencher
(e o sorriso da Mona Lisa no rosto
desdenhando o que não consegui).



Márcia Leite


Percebe-se uma ironia no sorriso.
Pode ser que sim, pode ser que não.
Ironia tem dessas coisas...
O seu olhar pode estar irônico; o sorriso do outro, não.
Portanto, percepção é vaguíssimo abstratíssimo saber.
Márcia Leite

terça-feira, 12 de maio de 2009






O Viajante Eleito


“Há uma imensa melancolia na lucidez que me acompanha”
A Colhedora de Palavras, in Versos Descarados.



Retirou a alma do Viajante Eleito, onde (ela sabia) não encontraria o brilho da intelectualidade. Guardou-a entre seus tesouros: cartas de amor, fotos dos tempos de inocência, pétalas de rosas secas pelo tempo (inclusive das ofertadas pelo Viajante Eleito), postais da amiga distante, mechas de cabelo dos filhos quando bebês, mantras para momentos de desespero, autos litigiosos para nunca esquecer.

A alma do Viajante Eleito aconchegou-se entre os perfumes das suas preciosidades. Recendia à tristeza e sândalo. Mas, sendo guardado novo, seu cheiro se destacava sobre os demais como saudade viva que dói aguda.

O Viajante Eleito continuou sua caminhada, dizendo-se sem sol, sem vontade de vida. Lágrimas e o deus dos que amam preencherão o vazio do corpo. Ela, a guardiã de sua alma, era a mais solitária vendo-o ir. As mãos endureceram, retendo o gesto de arrependimento, no mesmo momento em que o coração partiu-se. Cheirou a alma recém-guardada e resistiu. Entendeu que a tomara por egoísmo. Ela será o conforto quando ressentir-se da solidão que acompanha a lucidez e precisar do delírio amoroso que habita os emaranhados de loucura que só uma alma apaixonada guarda.

Márcia Leite